Archive for ‘Conto’

14/06/2010

De peito aberto

Já era tradição: quinta-feira, lanche de churrasco com queijo na padaria da subida. Eu gostava de dizer “da subida” porque dava um tom de sacrifício, uma quebra na rotina sedentária para justamente comer algo nada saudável. Trabalhar muito em casa me deixava meio deprimido, então era bom criar esses hábitos forçados, ver gente, sair um pouco da nuvem de poeira e pelos de cachorro.

Quinta também era dia de me juntar aos machos de plantão do bairro e ficar na padaria secando a bela Luísa. Eu acho que é um pouco daquela ingenuidade de motorista de ônibus, sempre dando carona para a mulherada e, claro, nunca pegando nenhuma. A mulher esperta se aproveita, economiza a passagem e, de quebra, parte uns dois ou três corações por dia.

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21/05/2010

Quórum

Era um plano simples: reclamar de dores misteriosas por semanas, comprar atestados médicos de uns açougueiros para justificar as faltas no trabalho, subornar o legista, pagar uma funerária – haja dinheiro! – e, depois, simular sua própria morte.

A pergunta martelava a cabeça já meio febril: quem iria? Quem não iria? Quem estaria chorando? Quem estaria de óculos escuros só fingindo chorar? Quem traria mais flores? Quem não vestiria preto? Ele se deliciava com as possibilidades, já sentia uns frêmitos de emoção contida, já sorria de antemão só de imaginar.

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19/05/2010

O crime perfeito

Ele se inquietava em sua cadeira. Já não agüentava mais ouvir aquela gente falando; nos últimos dias, sua mente tendia a divagar muito mais do que o usual, levando-o a horizontes que os outros alunos jamais sonhariam em visitar. Nestes dias de ócio, ele costumava fantasiar sobre qualquer coisa que viesse à mente, em uma espécie de passividade intelectual que o tomava irremediavelmente na segunda aula do dia; nestes momentos, ele simplesmente se distraía e deixava sua mente o levar, como em um sonho: pensamentos aleatórios e imagens dispersas afloravam e bruxuleavam, desaparecendo em frações de segundos – nestes momentos é que as idéias costumavam aparecer.

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14/05/2010

Roubiscoitando

A barriga tremegritava. O menino fomeava e sozinhava no quarto quietescuro. Dardolhou em todorredor, mas mamãe inestava… prepensou em gritejar e chorulhar por ela, mas com todos inestando, pra quê? Era hora de rapidagir.

Porcimou a gradiúncula do berço e pulitou no chão. As almofadas, amortecentes, desdeixaram o menino na mão. A mãe bravejaria, mas o menino só estava meninando! Quem inesperaria algassim?

Alegreiro, o menino avançozinhou pelo chão durifrio. De supetanto, sossurgiu um quadrivulto: um amigo cachorrava latinte e lambia e relambia e trelambia o menino, que gargalhejava muitamente.

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